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Telemedicina não se trata de uma decisão geral e sim individual

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O ator mais importante no sistema de saúde é, e sempre será, o paciente. É ele quem deve estar no centro do cuidado. É por ele e com ele que as decisões devem ser tomadas. Na teoria é isso, segundo o próprio Código de Ética Médica. Mas, será que isso está sendo realmente levado em consideração no processo de regulamentação definitiva da telemedicina, que está em discussão no Congresso Nacional?

Antes de qualquer argumento convém lembrar que medicina e telemedicina não concorrem em hipótese nenhuma entre si. Pelo contrário, elas se complementam na missão de agregar valor à saúde e ampliar o acesso da população ao cuidado de qualidade. A telemedicina é simplesmente medicina, utilizando ferramentas de comunicação à distância e apoio da ciência computacional, com a vantagem de encurtar barreiras físicas, usar soluções de apoio para melhor decisão e estar presente ao lado do paciente quando, como e onde ele precisar que o profissional de saúde esteja.

No entanto, o Conselho Federal de Medicina (CFM) está defendendo que apenas retornos possam ser feitos por telemedicina e que as chamadas “primeiras consultas” devem ser sempre no formato presencial.

Já eu, como especialista da telessaúde, afirmo que não é a primeira consulta, a de retorno, ou qualquer outra, que deva ser feita ou não por telemedicina. Quem determina isso é o médico, usando a tecnologia e conhecimento científico disponível, claro que sempre com a anuência do paciente.

Sou obstetra, especialista em gravidez de alta complexidade e recebo aqui em São Paulo pacientes de diversas regiões do país. E, desde 2012, quando começamos a nos aprofundar no estudo da telemedicina no Hospital Israelita Albert Einstein, realizo uma pré-consulta online para determinar a real necessidade de o paciente deslocar-se até São Paulo. Faço exame físico à distância – a chamada telepropedêutica, posso solicitar exames, como ultrassom, e hoje temos disponíveis tecnologias para acessar dados biométricos em tempo real. Ou seja, sou perfeitamente apto a tomar decisões mesmo estando longe fisicamente do paciente, mas aproximado pela tecnologia. E com isso, consigo muitas vezes referenciar para algum especialista da cidade onde o paciente mora, criando uma rede para dar continuidade ao tratamento, eliminando assim a necessidade de a paciente vir pessoalmente.

Esse é apenas um exemplo das vantagens. Limitar a utilização da telemedicina, seja determinando quando ou não uma consulta pode acontecer à distância; ou então impedindo que médicos atendam por meio das plataformas tecnológicas pacientes de outros estados diferentes dos seus, não só deixa a saúde ainda mais vulnerável e anula as tentativas de levar cuidados a regiões até então pouco assistidas, como contradiz um dos princípios que norteiam a bioética médica.

Autonomia, Não-Maleficência, Beneficência e Justiça. Esses são os quatro princípios bioéticos seguidos na prática clínica. As pessoas têm o direito de decidir sobre as questões relacionadas ao seu corpo e à sua vida. Quaisquer atos médicos devem ser autorizados pelo paciente.

Por outro lado, é o médico quem tem o conhecimento e a autonomia para prescrever o melhor tratamento e, muitas vezes, em conjunto com o paciente, definir o que será feito. Inclusive, a autonomia do médico com relação às questões de medicação, por exemplo, é bravamente defendida pelas principais instituições, conselhos e associações médicas.

Precisamos ter claro que a telemedicina não é uma porta a menos e sim uma porta a mais para que o paciente chega até o sistema de saúde. Acredito na telessaúde plena e em seu papel vital para alcançarmos nossos objetivos e garantir um atendimento digno, com qualidade, mas também ágil, eficiente e racional.

A utilização de recursos eletrônicos pode aumentar o engajamento do paciente, tornando-o o maior parceiro da sua própria saúde. Cabe a cada profissional, especialmente ao médico, avaliar se a consulta realizada à distância com o uso de tecnologia é adequada ou não. É essa autonomia de escolha que deve nortear o ato de cuidar das pessoas.  Vamos respeitar isso. Não podemos deixar, nós todos, como brasileiros, que nos seja usurpado esse direito de escolha.

Dr. Eduardo Cordioli é presidente da Saúde Digital Brasil (SDB)

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