O alto custo da integração de dados no setor de saúde ainda é um desafio global. Enquanto países avançam na digitalização, o Brasil enfrenta obstáculos financeiros e estruturais. Durante palestra no Lounge by SDB no HIS 2024, Teresa Sacchetta, diretora na InterSystems, apresentou cases práticos de interoperabilidade e refletiu sobre quem deve arcar com esses custos.
A interoperabilidade de dados no setor de saúde é uma tendência crescente ao redor do mundo, prometendo melhorar a coordenação de cuidados, aumentar a eficiência e reduzir custos. No entanto, essa integração apresenta desafios complexos, sendo o custo um dos maiores entraves. Países como a Finlândia, Dinamarca e Austrália já investiram pesadamente em soluções para integrar seus sistemas de saúde, enquanto no Brasil a implementação de interoperabilidade enfrenta um grande dilema: quem paga a conta?
Teresa Sacchetta, especialista em interoperabilidade e diretora na InterSystems, associada da Saúde Digital Brasil, trouxe à tona essa discussão durante o HIS 2024, abordando experiências internacionais e analisando como esses países conseguiram superar as barreiras financeiras. Ela ressaltou que, apesar dos avanços em diversos locais, o Brasil continua atrasado, especialmente em comparação a outras nações da América Latina. A fragmentação do sistema de saúde brasileiro, tanto entre os setores público e privado quanto no uso de novas tecnologias, como dispositivos conectados e plataformas de healthtech, torna a questão da integração de dados ainda mais urgente e complexa.
O desafio do financiamento
De acordo com Teresa, a principal dificuldade em alavancar a interoperabilidade no Brasil é a falta de clareza sobre quem deve financiar esses projetos. “Nos casos da Finlândia e da Dinamarca, o governo tomou a frente dos investimentos, criando redes nacionais de saúde digital e plataformas de interoperabilidade que conectam todos os prestadores de serviços. No Brasil, essa liderança ainda não está clara”, afirmou.
Ela também destacou exemplos de modelos mistos, como na Austrália e no Reino Unido, onde o governo inicia os investimentos e o setor privado se une para financiar e sustentar o sistema. No entanto, Teresa enfatizou que, para que a interoperabilidade funcione de forma eficaz, é necessário um compromisso de longo prazo de todas as partes envolvidas.
Parcerias público-privadas: uma saída possível?
Nos Estados Unidos, o modelo de Health Information Exchanges (HIEs) mostrou que parcerias público-privadas são uma solução viável para a integração de dados. “As HIEs começaram como iniciativas regionais, com instituições trocando dados entre si, e hoje se expandiram para redes nacionais. Esse modelo poderia ser adaptado para o Brasil, onde o setor privado tem um papel importante”, sugeriu Teresa. Ela ressaltou que, em muitos casos, o avanço só aconteceu após a imposição de multas a instituições que não compartilhavam dados, um mecanismo de pressão que poderia ser considerado no contexto brasileiro.
Os benefícios da interoperabilidade
Teresa enfatizou que, apesar dos desafios financeiros, os benefícios da interoperabilidade são claros. Ela citou exemplos da Estônia, onde o sistema de saúde conectado há mais de 20 anos tem mostrado uma redução significativa de erros médicos e maior eficiência no acompanhamento de pacientes crônicos. Na Finlândia, os ganhos financeiros também foram expressivos, com o país economizando mais de 1,3 bilhões de euros em cinco anos, graças à automação de processos e à melhor gestão dos recursos de saúde.
“É difícil argumentar contra a interoperabilidade quando vemos os resultados: menos desperdício, maior coordenação de cuidados e uma população mais saudável. Mas para colher esses frutos, é preciso investir e, principalmente, superar o receio de curto prazo de perda de receita que muitos prestadores de serviços de saúde têm”, refletiu Teresa.
Brasil: entre o público e o privado
No Brasil, ainda há muito a ser feito. Teresa mencionou que algumas iniciativas isoladas, como a Unimed, já estão investindo em repositórios unificados de dados de saúde, mas o avanço em larga escala depende de um alinhamento mais claro entre governo e setor privado. “A interoperabilidade é um caminho sem volta para aumentar a eficiência e a qualidade do atendimento. Mas, para que funcione, precisamos de mais investimentos e de um consenso sobre quem deve financiar esses projetos”, concluiu.
Com exemplos inspiradores de outros países e um olhar atento às especificidades do mercado brasileiro, Teresa deixou claro que o futuro da saúde no Brasil depende da capacidade de superar os desafios financeiros da interoperabilidade e de transformar a fragmentação do sistema em um modelo conectado e eficiente.