Convidados da SDB, Anahp e ABCIS apontam, como pontos de atenção na saúde digita e como cenário esperado para os próximos anos, a educação, preparação dos recursos humanos, necessidade de mapeamento dos gaps e a construção de um painel de indicadores
Nesse mês de abril, a Saúde Digital Brasil (SDB), a Anahp (Associação Nacional dos Hospitais Privados) e a Associação Brasileira CIO Saúde (ABCIS), promovem a Jornada Digital Inovação e Tecnologia, com foco na área da saúde. Os encontros são on-line e acontecem todas as quintas-feiras do mês de abril. O primeiro encontro, mediado por Caio Soares, presidente da SDB, contou com a participação de Carlos Pedrotti, do Einstein; Donizetti Giamberardino, do CFM; e Giovanni Cerri, do HCMUSP. O tema do debate foi o avanços da telessaúde no Brasil e seus impactos no sistema de saúde.
Segundo Caio Soares, a velocidade da transformação provocada pelo advento da telessaúde é brutal e reflete em todas as áreas. Esse cenário provoca não apenas a expansão e a consolidação da telessaúde, como possibilita aprimorar a cadeia de saúde, por meio da oferta de serviços capazes de ampliar o acesso e a qualidade do atendimento. “Passamos a ter uma nova realidade, em que os atendimentos presenciais e digitais, antes isolados, agora são integrados, havendo a formação da rede de saúde e a conexão dessas especialidades de referência, telediagnóstico e aumento da capacidade de triagem. Tudo isso faz com que o ambiente de saúde esteja em ebulição”, ressalta o presidente da SDB.
Nesse sentido, os participantes ressaltaram o quanto ia telessaúde corroborou com a redução de custos e aumento do acesso aos serviços de saúde, principalmente em regiões onde os serviços são mais escassos, como locais de difícil acesso e, periferias das grandes cidades.
Giovanni Cerri destacou que a pandemia evidenciou, pela primeira vez, o quão prevalente poderia ser o uso da tecnologia no ecossistema de saúde brasileiro. Segundo Cerri, a saúde digital saiu do conceito da teleconsulta, graças à percepção de que ela poderia resolver grandes gargalos, como a regulação da urgência. “Hoje sabemos que os prontos-socorros estão cheios de pessoas que não deveriam estar lá, prejudicando o atendimento dos doentes mais graves, por exemplo. Vimos uma evolução não só na atenção primária, mas também em algumas especialidades como psiquiatria, na qual a utilização da telemedicina passou a ser corriqueira. Tem também o acompanhamento de pacientes crônicos à distância e o avanço do telemonitoramento por meio de devices, o que talvez seja a área mais promissora para startups. As possibilidades são muito grandes”, ressalta.
A capacitação dos profissionais para a prática da Saúde Digital foi outro ponto destacado pelo especialista e pelos outros participantes da mesa, que enfatizaram que a inovação, empreendedorismo, robótica e saúde digital devem estar presentes desde a formação universitária dos estudantes da área da saúde.
Cerri relembrou ainda que, no início da pandemia, quando questionados sobre estarem preparados para o atendimento digital, a opinião dos profissionais do Hospital das Clínicas, em São Paulo, foi unânime: todos disseram que gostariam de utilizar os recursos, mas não se consideravam aptos a isso. A criação de um curso de capacitação transformou esse cenário. “Estamos na era digital. As técnicas bem utilizadas e com profissionais preparados podem levar a saúde para uma população que hoje não está assistida adequadamente”, enfatizou.
O aprimoramento da experiência do profissional da saúde também foi um dos pontos abordados por Carlos Pedrotti. O especialista destacou esse como sendo um dos principais desafios para o avanço da adoção da prática, junto à necessidade de proporcionar melhores experiências para o paciente e fazer uma melhor gestão dos dados.
“Como treinar profissionais, desde a recepção até o time assistencial, para absorver essa demanda em escala explosiva? E, ainda, como tornar a experiência digital desse profissional mais rápida, clara e intuitiva? Os serviços de telemedicina ainda são complexos, desde o cadastro, até o pagamento, etc., ficando bem aquém de outras experiências digitais que as pessoas vivenciam, como comprar uma geladeira, por exemplo. O foco está muito mais na tecnologia do que na experiência, que deveria ser fluida.”
Pedrotti ressaltou a importância do controle da qualidade dos serviços prestados à distância, em especial por conta da abundância de sistemas existentes e a dos dados que estão sendo gerados. Com os dados digitalizados, amplia-se, por exemplo, a possibilidade de aprimorar a gestão e a qualidade, agregando mais valor à entrega dos serviços prestados, tanto a quem não tinha acesso quanto àqueles pacientes que preferem o conforto e a conveniência proporcionados pela tecnologia.
“Temos o desafio de tornar mais sustentável o sistema. Hoje, prestador e operadoras ainda enfrentam problemas críticos, e a telessaúde é um caminho para melhorar a sustentabilidade. Isso porque reduz a demanda por estrutura física e otimiza a entrega do serviço. O apoio à atenção primária tem trazido benefícios, diminuído a pressão nos sistemas terciários, que são mais custosos, e evitado deslocamentos de barco, em estradas degradadas, com redução do custo de logística, grande resolutividade e alto grau de satisfação. Nunca foi, pelo menos neste século, questão de tecnologia; é uma questão de processo e de como desenvolver as experiências do paciente, do médico e de todos os profissionais”, esclarece o especialista.
Donizetti Giamberardino contextualizou como a regulamentação da telessaúde, para viabilizar a prática segura e regulada, veio sendo aprimorada ao longo do tempo. Atualmente, existe uma resolução bastante madura no país, que seguirá em evolução, conforme o ser humano e a sociedade forem passando por transformações. Também ressaltou os desafios que surgiram, ao longo desse processo, como pensar em mecanismos que garantissem da pessoalidade, o conforto e a segurança do paciente no atendimento remoto.
Essa foi, inclusive, uma das contribuições do CFM ao setor, o qual, através da regulamentação, ajudou a promover a ampla aceitação no território nacional, o que era um problema antes. “Tivemos que atuar com certa vulnerabilidade, diante de uma emergência sanitária. A classe médica estava dividida e a aceitação mudou muito por parte dos médicos.”, enfatiza.
Giamberardino ressaltou, ainda, a importância da preservação da autonomia dos pacientes e dos profissionais para optarem pelo uso da tecnologia. “Hoje temos a defesa da autonomia do médico, mas sempre de mãos dadas com a responsabilidade. Essa resolução teve a intenção de deixar claro que é a mesma medicina e o mesmo código de ética médica, reforçando que a tecnologia deve ser usada conforme a necessidade de tomada de decisão. É preciso garantir a qualidade com todas as prerrogativas mantidas no nosso código de ética médica”, conclui.